Gol de Letra - Primeira Tabelinha

O casamento de Romeu e Julieta brasileiro*
A nossa primeira tabelinha é com o jornalista Beto Xavier, autor de Futebol no País da Música, pela Panda Books. Resultado de 15 anos de uma pesquisa inédita, o livro traça um paralelo entre o futebol e música, as duas grandes paixões nacionais, segundo Xavier. Entrevistas com craques da bola e alguns dos principais nomes da música popular brasileira, trechos de canções e fotografias recheiam as histórias que contam a trajetória do futebol brasileiro.
Segundo o autor, o gênero que mais se identifica com o esporte é o samba. A relação com o estilo musical ocorreu de forma natural. Ambos tiveram ascensão nos anos 30. Assim como o futebol, que para jogar basta ter um instrumento esférico, para tocar samba basta ter uma caixinha de fósforo, uma lata. Fazer samba é fácil, não querer instrumentos específicos, e assim é com futebol.

O futebol ganhou outro campo, o da literatura
Beto Xavier, também, conversou sobre o futebol estar cada vez mais presente como objeto de pesquisas e estudos no meio acadêmico e na literatura. Para Xavier, o grande divisor de água de o futebol ser estudado e estar ai nos livros é a obra de Rui Castro sobre o Garrincha, Estrela Solitária. A partir daí o meio literário, as editoras viram que falar de futebol, clubes ou sobre algum atleta famoso também pode ser um grande filão da literatura. Hoje em qualquer livraria já tem até um setor determinado ao esporte. Aqui saem os livros do Inter e do Grêmio, como os escritos pelo Ruy Carlos Ostermann, e de alguns jogadores de futebol. Lá em São Paulo, também, de craques como Ademir da Guia e Rogério Ceni. No Rio de Janeiro, tem livro sobre o Zico.


É muito interessante que o
futebol seja objeto de estudo e também sirva de
inspiração para os
escritores
”, diz o jornalista.
Cristiane Serra – Beto, no teu livro, tu relacionas futebol com a música brasileira, diz que eles se casaram.Quando eles começaram a namorar e quando casaram de fato?
Beto Xavier – Na verdade, o meu livro ele diz que o futebol já nasceu casado com a música. Porque usa uma comparação, um fato: Charles Miller, que foi a pessoa responsável por introduzir o futebol no Brasil, era casado com Antonieta Rudge, que era uma eximia pianista e interprete de Chopin, isto na década de 10, começo do século passado. É apenas uma fonte para eu falar deste casamento que existe desde o começo dos anos 10 no Rio de Janeiro. Onde, havia muito choro, polca, salsa, todos esses gêneros musicais. E o futebol, também, começou a ficar famoso, a ser introduzido na sociedade. Mas o marco desta relação se deu começo dos anos 30, quando surgiu a Rádio Nacional, e o futebol se profissionalizou. Ao mesmo, tempo o samba se tornou o grande ícone, o gênero musical oficial do Brasil, com Noel Rosa, Cartola, Wilson Batista e Ary Barroso. E do lado do futebol quando surgiu os primeiros grandes craques da época, como Leônidas, Friedenreich e Perácio. Logo, não era anormal que os músicos também se inspirassem no futebol para fazer algumas músicas. E nasceram grandes composições falando de futebol naquela época.

Cristiane– Além de Jorge Benjor, que música brasileiro pode lançar uma coletânea só de músicas sobre futebol?
Beto- O Benjor é o fenômeno recente, foi a partir dos anos 60-70 que começou a tratar de futebol. Flamenguista fanático, fez talvez o maior clássico da música de futebol, a canção Fio Maravilha. Mas antes disso, alguns compositores também cantaram futebol de maneira muito importante. O sambista e flamenguista Wilson Batista, entre anos 30 e 50, tem várias músicas de futebol. O Ary Barroso, embora, não tenha feito muitas canções com o tema, tem uma ligação muito forte com esporte. Foi até locutor e repórter esportivo. Também, recentemente Moraes Moreira também pode ser incluído sempre um dos grandes cantores. E por fim, o Chico Buarque tem essa ligação que todo mundo conhece.

Cristiane– Trazendo para o Rio Grande do Sul, a gente pode citar…
Beto– Tem um nome emblemático na relação do futebol com a música que é Lupicínio Rodrigues, que fez o hino do Grêmio. Com certeza é um dos hinos mais bonitos de todos os clubes brasileiros. Só ai já é um grande casamento, mas tem outros compositores do Rio Grande do Sul também cantaram futebol. Como, por exemplo, o Teixeirinha, que foi talvez o artista popular mais famoso da história da música popular do Rio Grande do sul, tem várias músicas falam de futebol. O cantor tem uma parte de desafios que fez com a Mary Terezinha, na década de 60, que ele canta o Grenal, canta outra canção que fala do clássico Palmeiras x Corinthians. Além de outra gravação, que fala sobre o futebol dos bichos, que muito interessante.

Cristiane– Qual o jogador que mostrou talento como compositor, cantor ou músico?
Beto– Alguns tentaram, mas a maioria foram tentativas frustrantes. O Pelé teve a sorte gravar duas músicas com a Elis Regina, um compacto simples chamado Tabelinha, em 1970. O Tite, jogador dos Santos da década de 50, foi um dos que melhor entrou neste campo da música, gravou um compacto com seis músicas, ele era bom cantor e tocava bem violão. Tite era contemporâneo do rei, incluvise foi ele quem ensinou o Pelé a tocar violão na concentração do Santos, eles jogaram juntos na década de 50. Mas sem dúvida o melhor jogador que deu na música, foi o Júnior do Flamengo. Que além de interpretar bem samba, foi o jogador que mais venceu. O Júnior chegou a vender mais de 650 mil cópias do compacto Voa Canarinho, em 1962, que acabou se tornando o hino da Seleção Brasileira na Copa da Espanha.

Cristiane– E invertendo a situação, quais são os músicos que batem um bolão?
Beto– A maioria dos músicos jogam futebol, nem todos são bons. Mas tem muitos músicos famosos que são bons de bola. Fagner, Chico Buarque, Zé Cabaleiro, Evandro Mesquita, todos jogam bem. Moraes Moreira e os outros Novos Baianos, chegaram ao ponto de fazerem um campo com dimensões oficias da FIFA.

Cristiane– No livro, tu comparas os Novos Baianos com o carrossel holandês, a laranja mecânica da Copa de 74. Por quê?
Beto– A seleção da Holanda, em 1974, chamada de carrossel, tinha a característica de todos jogarem sem posição fixa, todos atacavam e defendiam ao mesmo tempo. E os Novos Baianos era mais ou menos essa filosofia, todos cantavam e faziam as composições. E, principalmente, ambos deram ares inovadores a suas áreas. O esquema do time holandês, considero a última grande revolução do futebol. E os Novos Baianos, também, foram revolucionários. O grupo uniu o rock com o samba. Além dos dois terem surgidos mais ou menos na época.

Cristiane – Tem algum outro país tão apaixonado por futebol e com tradição semelhante de música sobre o esporte?
Beto- Não. A relação do futebol com a música no Brasil é a maior, isso não tem nem dúvida. Não é a toa que são as duas grandes artes brasileiras, são os nossos dois maiores produtos de exportação. O brasileiro é bom de samba e futebol. Este é um selo que nós vendemos para o mundo inteiro. Mas, na Inglaterra a relação também muito forte. Lá é mais comum jogadores gravarem discos. Até pouco temo atrás a seleção inglesa, por exemplo, se reunia em época de Copa do Mundo para os jogadores gravarem a musica oficial do time. Na Alemanha, na Holanda e Espanha também acontece isso. Mas como no Brasil é impossível, uma coisa está ligada a outra de maneira única no universo.

Cristiane – Falar em futebol brasileiro não tem como deixar de citar, Pelé. Mencionado o Rei é quase impossível não compara-lo com Maradona. Quem recebeu mais homenagens musicais?
Beto- Maradona foi mais cantado, inclusive, no site Maradona 10 tem todas as canções inspiradas no boleiro. Embora Pelé represente muito para os brasileiros, o argentino é mais idolatrado. Mas, o rei também é homenageado de várias formas em grandes momentos da música brasileira.

Cristiane – A gente vê ai o Ronaldo mais uma vez dando a volta por cima. Com uma cadeira tão brilhante, mas, ao mesmo tempo recheada de altos e baixos. Qual seria a música do Fenômeno? Seria a composta por Marcelo D2, Sou Ronaldo?
Beto- É, o Marcelo D2 fez essa que foi um estourou, e foi muito feliz. A letra dela diz tudo. Mas o Ronaldo vai mais cantado na música brasileira, depois dessa volta para o país, jogando no Corinthians. Na verdade o jogador foi para a Europa muito cedo, o brasileiro quase não viu o Ronaldo jogar bola. Agora que o povo brasileiro tá vendo ele jogar bola, vai receber mais homenagens musicais.

Cristiane – Na tua opinião, qual gol merece uma música?
Beto- Eu faria uma música para o gol que o André Catimba marcou na final em 1977, no Grenal que acabou a hegemonia de oito anos do colorado aqui no Rio Grande do Sul. Aquele gol que ele recebeu o passe do Iura e bateu de perna direita, meio enviesado. Quando foi comemorar sentiu a perna, uma distensão, e caiu de peito no chão, o que resultou na sua substituição. Aquele gol merecia uma música, com certeza.
*Texto publicado no Blog da Cristiane Serra

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Estreia

A partir desta semana este nosso meio de contato vai trilhar por outros gramados. Vai ao ar, a seção Gol de Letra. E como não é novidade para ninguém que esta futura jornalista que vos escreve tem grande apreço pelo esporte que é a paixão nacional, logo, o futebol será o tema pertinente no blog. Entrevistas, crônicas, textos e relatos de quem não só vivencia, contando o que rola dentro e fora das quatro linhas, mas também escreve a história do esporte, vão nos ajudar a entender um pouco mais do mundo da bola.

E para dar o ponta pé inicial cito dois trechos do livro Futebol ao sol e à Sombra, de Eduardo Galeano, que exemplificam bem como o autor define o esporte. Para o jornalista uruguaio, nada se sobrepõe ao encanto da “festa pagã”, que é o futebol. Onde o jogo se transforma em saga, desperta paixões, cria mitos, heróis, glórias e tragédias.

“-Como a senhora explicaria a um menino o que é felicidade?

- Não explicaria – respondeu.

– Daria uma bola para que ele jogasse. (Pergunta feita por um jornalista à teóloga alemã Dorothee Sölle)” (contra capa)

Mas como nem tudo são flores, há também o lado sombrio. Um mundo à parte, que envolve poderosíssimos interesses políticos e financeiros, segundo Galeano.

“O futebol profissional faz todo o possível para castrar essa energia de felicidade, mas ela sobrevive apesar de todos os pesares. É talvez por isso que o futebol não pode deixar de ser assombroso.(…) Por mais que os tecnocratas o programem até o mínimo detalhe, por muito que os poderosos o manipulem, o futebol continua querendo ser a arte do imprevisto. Onde menos se espera salta o impossível, o anão dá uma lição ao gigante, e o negro mirrado e cambaio faz de bobo o atleta esculpido na Grécia.” (p.204)

P.S. : E para não dizerem que eu só copio os textos feitos de um blog para outro... Boa parte do material postado aqui será produzido para o Blog da Cristiane Serra. Como o tema é pertinente em ambos, resolvi postar nos dois, ;) .

domingo, 3 de maio de 2009